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XXXVIII
"TIMIDEZ"
Vai ao anoitecer haver luar...
Das nuvens nós faremos fértil cama
E servirão cometas, cauda em chama,
Para lençóis tecermos com vagar...
Vai ao entardecer ferver o ar,
Na orvalhada terra cozer lama,
E vai a própria vida arder de fama
Ao sentir duas almas gémeas, par,
Prontas pra se fundirem num só grito...
Vai ao anoitecer tecer a Lua
Mantas de estrelas, capas de infinito,
Só pra cobrir a tua forma nua...
Vai o entardecer nascer cortês
Rendido ao teu sorriso e timidez!
Gil Saraiva
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XXXVII
"A ADRAGA"
Desce estrelado o Sol até ao mar...
Voa a gaivota, em vê, o céu cortando...
Brilha suave a água, iluminando
A linha do horizonte e, devagar,
A própria areia emite o seu brilhar
E a paisagem, aos poucos, vai dourando.
Veste de negro a rocha, sombreando
O que o Sol já não pode iluminar...
Despe de luz a praia e no poente.
E eu espero ver surgir a sombra bela,
Do teu ser decorando esta aguarela,
Tornando a paisagem transcendente.
Ao pôr-do-sol, eu peço que uma vaga
Te faça vir em mim... aqui... na Adraga!
Gil Saraiva
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XXXVI
“MAR E TERRA”
O teu olhar sem fim bebeu selvagem,
Este meu pobre ser, desgovernado...
Perante um corpo assim tão torneado,
Eu me rendi à divinal paisagem.
Se o teu ser me pedia uma massagem,
O meu, em ti, ficou paralisado.
A custo, de meus dedos fiz arado
E com eles lavrei uma passagem
Por vales, por encostas, com ternura,
Em momentos roubados ao prazer,
Que entre nós cresceu no verbo ter,
Sorrindo no secreto da loucura.
Vampírica paisagem, que sem guerra,
A ambos transformou em mar e terra...
Gil Saraiva
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XXXV
"NAVEGAR"
Na frescura da derme acetinada
Se refletem odores de sangue quente...
Reveste-lhe esse corpo a alma ardente,
Que no brilho do olhar se vê espelhada...
Génese de uma vida, de uma estrada,
Que apenas é trilhada por quem sente
O ser selvagem, por detrás da mente,
Que no sorriso parece tudo e nada...
É morno o toque, doce o paladar,
Fervente o cerne, corpo já sem mágoa,
Que parece nesta hora ir navegar
Em taças de luar ou em rios de água,
Onde apenas navega uma certeza:
A chama que o amor mantém acesa!
Gil Saraiva
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XXXIV
“GRANDE”
Grande no peito, coxas e assento,
Grande nos olhos, grande no sorrir,
Grande na alma, grande no sentir,
Grande no verbo amar, no sentimento,
Grande no ser mulher, no pensamento,
Serena a acordar, grande a dormir,
Bem grande a dar a mão e grande a rir,
Mas tão grande que chama brisa ao vento,
Que o mar é gota de água transparente
E saudades minutos que não passam,
Dramáticos instantes que a ameaçam,
Pois dar o coração é estar presente…
Tu és assim tão grande que, p'ra mim,
Duna vira deserto e flor… jardim…
Gil Saraiva
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XXXIII
“PENA INFINITA”
Que mais posso dizer sobre este amor?
Adjetivar o quê que falte ainda?
A poesia eu já darei por finda
Ou falta-me algo mais para a compor?
Falar, talvez, da alma e em louvor
De como, em mim, ela é sempre bem-vinda,
Gritar pelos pulmões que é bela e linda
Ou dar palestras nobres do fulgor
De como sou amado, em cada dia,
Talvez... dizer, em verso, que é divina,
Quanto tem de selvagem e menina,
Como sem ela morre a poesia.
Sim, porque, enquanto a amar, minha alma grita
P'la tinta desta pena infinita!
Gil Saraiva
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XXXII
"PERDIDO..."
Contigo quero ter o sexo porno,
Lascivo, sado, louco, inconcebível...
Contigo quero ter indescritível
Noite de amor, ao rubro, como um forno...
Contigo quero ser metal no torno,
Pronto pra ver moldado de impossível
Meu aço, às tuas mãos, inconcebível...
Contigo quero ter o beijo morno,
Dado pelos amantes imortais,
Em noites, p'los poetas, não sonhadas...
Contigo quero ver as madrugadas
Plenas de nós e amor, entre teus ais...
Contigo quero amar, louco, varrido,
E dentro do teu ser dar-me perdido!...
Gil Saraiva
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XXXI
"PANDORA"
Na secreta penumbra de meu quarto
A noite chega esbelta, uma vez mais,
Com abraços divinos, nupciais,
Me aquecendo o sangue de lagarto...
Ligo o computador e outra vez parto
P’la caixa de Pandora, como um cais,
Em que o barco sou eu e outros mortais
Com quem as minhas letras eu reparto...
Nesta mágica caixa sem demora,
Buscando o raio dourado de outro Sol,
Em mundos onde eu possa ser farol,
Eu procuro o segredo de Pandora...
Que a bruma se desfaça, finalmente,
Que o mistério passou a evidente!...
Gil Saraiva
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XXX
"FLOR OCULTA II"
Tu nesses olhos tens um amor latente
E nesses lábios teus, paixão sorri...
Meu coração parece um colibri
Batendo, ao ver-te, assim tão loucamente...
O porquê de um amor não sabe a gente...
Oculto da razão eu me perdi
Pra me encontrar, por fim, fundido em ti...
Mistérios de uma esperança impaciente...
O silêncio das estrelas tens no olhar,
Um só sorriso teu parece mil,
O som da tua voz me faz servil
E o teu amor, então... é de encantar...
Essência de mulher, pureza adulta,
Vá!... Desabrocha em mim... tu, flor oculta!...
Gil Saraiva
![Flor Oculta I.jpg Flor Oculta I.jpg]()
XXIX
"FLOR OCULTA I"
Por fim senti o cheiro da oculta flor
Escondida, de mim, por desvendar...
Provei não só o gosto ao ir provar,
Amei muito pra além do seu sabor...
Senti em cada pétala o amor
No toque, em cada som, em cada olhar...
Senti o impossível verbo amar
Em odores de pele, rios de calor...
Provei, senti, amei, enlouquecido...
P’lo desejo trepei, subi mais alto...
E gozei himalaias num só salto,
Everestes trepei na flor perdido...
Senti... por fim, em mim, a forma adulta
Me transformar também em flor oculta...
Gil Saraiva