II
"MELOPEIAS"
Melopeias róridas entre armila e umbra
Melodias recitadas de estros perdidos,
Húmidas orvalhadas sentidas na penumbra
Das palavras soltas aos nossos ouvidos,
De um anel de ferro escondido na bruma
De um caso de amor, de brilho e comoção,
Qual barca sentida que perdida ruma,
Sem destino certo e sem direção,
Até na maré atracar na espuma
De um cais escondido pelo por-do-sol.
Rimas de paixão que tu não soletras,
Por não entenderes o piar das aves.
Atrás da luz que combina as letras,
Dedicando à Lua chilreares suaves,
Canta as melopeias, à noite, o rouxinol,
Não usa palavras que rimem com tretas.
No jardim dos termos gira o girassol,
Não ingere gorduras, nem tem colesterol.
Vem manhã de orvalho, húmida, sensual,
Despertar o mundo para um novo dia,
Zumbem as abelhas, cala-se o chacal,
E ouve-se no campo agora a cotovia,
Porque na natura é mais que normal
O silêncio dar lugar sentado à poesia.
Melopeias canta o senhor da bruma,
Não masca tabaco, nem usa cachimbos,
Mas desenha armilas no fumo que fuma,
Um rei sem paços, vagabundo dos limbos.
Melopeias róridas entre armila e umbra
Melodias recitadas de estros perdidos,
Húmidas orvalhadas sentidas na penumbra
São palavras soltas aos nossos ouvidos…
Gil Saraiva
I
“APENAS”
Quotidianamente,
Sempre que me ausento
Levo-te no coração, no pensamento.
É algo fixo, firme, permanente,
Não me importa o que faz a outra gente,
Apenas tu e eu, só nós os dois,
Sem pensarmos no amanhã ou no depois.
Apenas importa o nosso amor!
Sem ele sou vácuo, sou vazio.
Apenas importa esse sabor,
No beijo, que me aparta do frio!
Podes contar a quem quiseres,
Mas ninguém precisa de saber.
Para mim estará bem o que fizeres
Se por amor o fores tu fazer.
Podes gritar os teus sentimentos
Ou escondê-los no escuro,
Nos segredos,
Não me importa se vagueiam pelos ventos,
Desde que assim mos dês,
Sem quaisquer medos.
Apenas importa a nossa vida!
Sem ela sou vácuo, sou vazio.
Apenas importa amar, querida,
No amor, que nos aparta o frio!
Se alguém existir no infinito
E olhar, de tão longe, o horizonte,
Poderá escutar este meu grito,
Ver nossa paixão em qualquer fonte.
Porque este amor, amor, não é um mito,
Mas o pilar mais forte desta ponte
Onde, de um lado, tu és a minha margem
E, do outro, eu sou a borda de água,
Qual forja de ferreiro, intensa frágua,
Pois que entre nós os dois
Sentir é rio e amar… passagem.
Quotidianamente,
Sempre que me ausento
Levo-te no coração, no pensamento.
É algo fixo, firme, permanente,
Não me importa o que faz a outra gente,
Apenas tu e eu, só nós os dois,
Sem pensarmos no amanhã ou no depois.
Apenas importa o que este, nós, quiser!
Sem ele sou vácuo, sou vazio.
Apenas importa seres mulher,
Do homem, que te aparta do frio!
Gil Saraiva
Introdução
Melopeias Róridas Entre Armila e Umbra é um livro criado na humidade existente entre o brilho e a sombra de um hino, que se declama por entre o anel usado na criação da esfera celeste, que divide, entre o verde e o vermelho, a bandeira nacional. Poderia antes dizer, procurando uma explicação mais singular, que são “Melodias Recitadas por Entre o Húmido Sombrio de uma Aliança Inimitável” ou, apenas, “Trovas de um Amor Luso”. São versos de um amor em tempos sombrios onde, enquanto poeta, procuro, como toda a gente, a esperança infinita da descoberta da alma gémea, numa aliança capaz de unir dois seres múltiplos e diversos, na mágica fusão humedecida de um amor uno e indivisível. Enfim, são versos de amor para um amor que se deseja real, sem laivos de impossível, sem fábulas perdidas nas lareiras dos antigos casarios da serra, rodeados de sombras e sortilégios, por entre a superstição das gentes, que as contam pelo passar do boca-a-boca, desde tempos já esquecidos neste tempo. Afinal, tudo é bem simples e pode ser condensado em três palavras: Poemas de Amor.
Gil Saraiva
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ADEUS HERÓIS DO MAR - CARTA DE UM TIMORENSE - LETRA: GIL SARAIVA - POEMA DE 1991 / NOVEMBRO POR GIL SARAIVA - FOI HÁ 30 ANOS - HÁ 30 ANOS - 30 ANOS - ANOS - NOS - OS - S...
VIII
"CARTA DE UM TIMORENSE"
Adeus Heróis do Mar
Das armas e barões já reformados...
Adeus a todos vós que edificaram
Este reino que um dia foi Timor
Adeus ó nobre Povo
De quem um dia herdámos
A força, a valentia, a resistência...
Faz muitos anos que da dor
Fazemos pão...
Desde o dia da vossa despedida
Que caça somos
De um vil invasor...
A vós Heróis do Mar
Pedimos hoje
Que com esplendor
Levanteis de novo
A nossa,
Hoje triste,
Terra de Timor...
Quando em Dili
Fomos massacrados,
Quem nos ouviu pode comprovar
Que em Português,
Ao morrer,
Dissemos: MÃE
Eu sou o Joaquim,
Ele o António,
Da Silva, da Fonseca, do Rosário...
Ó Heróis do Mar
Pois foi de vós
Que a palavra saudade
A nós chegou...
E que saudades de vós
Heróis do Mar!
Gil Saraiva
XVII
“LOUCURA DE MULHER”
Pelos cabelos,
De um maduro trigo,
Um rosto nasce simples, divinal.
E perco-me na obra,
Sem igual,
Por apanhar um sorriso doce,
Singelo, diria mesmo amigo,
Rindo como quem ri para consigo,
Nessa boca de beijos, sensual.
Erguem-se uns seios hirtos, naturais.
Move-se o tronco
Sem notar o perigo
Que um ser-se assim
Provoca noutro ser que o observe,
Mesmo que de passagem
E que fique assim retido na paisagem.
O caminhar faz os homens volver,
Olhar para trás
Para confirmar,
Como quem viu
E não quer crer,
Como quem pensa
Que está a imaginar.
Ancas perfeitas,
Ventre de morrer,
Mulher de sonho assim é,
Por ventura,
O sonho de um homem,
Na loucura!
Podes ser tu essa mulher,
Não precisas de ser um ser perfeito.
Podes ser magra, gorda, linda ou vulgar
Que o que importa mesmo é como o meu olhar
Te vê na loucura do que sou e do que sinto!
Gil Saraiva
XVI
“PASSAGEM PELA REDE SOCIAL”
Aqui, eu procurei uma amizade, auxílio, ajuda, apoio,
À minha imensa solidão. Aqui, eu revelei, sem ter pensado,
O estado do meu coração, a quem me quis ouvir e me deu troco.
Sinceridade, foi a palavra minha, a mais correta,
Lealdade, a forma de fugir de uma exclusão,
Faminto eu busquei a emoção,
De amar e ser amado de verdade.
Na rede social eu me despi totalmente
Das defesas que temos e, em cada dia,
Com afinco lutei pelo que queria,
Sabendo que se a sorte me quisesse
Poderia ser por ela bafejado,
Ou contrariamente comido ou enganado.
Com sorte, que sem ela nada acontece,
Numa tarde, ao anoitecer,
Eu te conheci,
Tinhas numa fotografia,
Esse sorriso teu,
Ali parado.
Como foi bom
Eu te ter procurado.
O tempo foi passando
E eu, entusiasmado,
Fiz juras de amor,
Promessas de pecado,
Até nós nos combinarmos encontrar,
Para vivermos juntos esse amar.
Finalmente o dia veio
E tu chegaste.
Vinhas de carro,
Com um homem e uma criança
À boleia no banco traseiro.
Paraste, riste,
E disseste ao homem ao teu lado:
“- Querido, este é mais um que ficou apanhado,
Olha só a cara dele, ali, pasmado.”
Gil Saraiva
XV
ANIVERSÁRIO”
Faz anos, hoje, o meu amor,
E muitos fez sem minha companhia,
Quando mais vinte celebrar, um dia,
Apagar, espero vê-la, com fulgor,
As velas, me sorrindo no calor de uma vida,
De risos e alegria. Sem tristeza, remorsos,
Mesmo sem nostalgia,
Mais feliz do que um dia quis supor.
Porque é lindo amar e ser amado,
Ter alma gémea sorrindo de bem perto,
Qual gota que dá luz e vida ao meu deserto,
Que me mata a sede de sentir,
Que faz de mim e dela o par mais certo,
Porque basta um olhar para se sorrir.
Um oásis assim, mais do que um desejo é sonho
Já sonhado, quadro imaginado,
Aspiração de um querer concreto.
Faz anos, hoje, o meu amor,
É chegado mais um aniversário, não me quero esquecer,
Feito otário, para não me arrepender ao fim do dia.
Não sei que prenda dar… se um respirar na praia a maresia,
Se um bolo com velas torneadas, se umas joias de família
Que tenho ali guardadas, se um quarto de hotel com fantasia…
O que lhe dar para sentir a euforia, a felicidade de um rosto
Apaixonado? Um anel, uns brincos, um pendente?
Talvez um brandy velho empoeirado, um vinho especial,
Uma aguardente? Um vaso de orquídea ornamentado ou um
Perfume raro e bem diferente? Uma noite de sexo e de pecado?
Se fosse a minha ex-namorada eu já sabia,
Um cartão de crédito dourado,
Carregado de euros, uma boa maquia,
Suficiente para me deixar bem penhorado,
Que para essa uma mais valia
Não era amor e sexo, mas “el contado ”.
Faz anos, hoje, o meu amor, a minha amada,
Espero não me enganar na prenda dada…
Gil Saraiva
XIV
“O AFINISMO HUMANO”
Não existe no dicionário a palavra “afinismo”,
É uma palavra só minha, pessoal, por mim criada, um neologismo,
Talvez, de vão de escada, contudo, cheio de significado e de lirismo.
Afinismo vem de afim, ou seja, semelhante, análogo, idêntico, igual
Ou parecido, ou seja, similar e consonante com um pensamento
Envolvido numa mesma forma de estar, de agir ou de gostar,
De seres diferentes, que por concordarem nisso se pensam unir,
Criando clubes, partidos, gerando umas correntes, onde se trocam ideias,
Onde a permuta é algo coerente e onde o objetivo é semelhante,
Próximo, comum, onde se luta pela mesma causa aliciante.
Pondo as rimas de parte, o afinismo é aplicação biunívoca entre duas
Ou mais coisas, sejam estas, atos, pensamentos, objetos ou ideias,
Tendo entre elas um denominador comum que une duas ou mais pessoas
Em seu torno e em sua defesa. Quando levado ao extremo, a sério
Ou à legalidade, ajuda a formar casais, partidários, adeptos, próximos,
Amigos, vizinhos, famílias e confrades. Porquê? Porque cada grupo
Se sente unido por perspetivas e projectividades de origem única,
Ou de princípios idênticos, quase iguais, diria… gémeos.
Cada movimento se agrega então, seguindo uma mesma linha reta
Ou uma outra que lhe seja colateral, de preferência paralela
Ou espelhada nos mesmos conceitos primários.
O afinismo defende que a sociedade se organiza em volta
Das mesmas analogias, conexões ou tendências,
Sendo que todas elas buscam a combinação associativa,
Ou legal se o direito dos Estados o exigir.
A História faz prova disso mesmo, nos milénios até
Hoje conhecidos, pois que sempre nos organizámos assim:
Entorno de uma terra, de um país, de uma língua,
De um líder ou de uma bandeira.
O afinismo promove as empatias, gera classes sociais
E sindicatos, ordens, movimentos, princípios,
Direitos e por fim as leis da sociedade.
Mesmo do campo emocional e do sentir
O afinismo cria os laços certos,
Seja entre casais ou entre amantes,
Seja no ódio, na dor, ou no amor.
Gil Saraiva
XIII
“O ESCORPIÃO”
“O escorpião é dor, é digno de medo, de respeito, de terror.
O escorpião é sorte, é signo de quem com a morte a seu favor,
Nasce sob a sua proteção, cheio de vida, de encanto de amor,
Porque o restante já lhe ocupa o coração.”
Posso eu ser um escorpião, porém, não me revejo nas palavras,
Anteriormente escritas nestes versos e que, a meu ver,
Não passam da ideia generalizada de que o animal é um ser do mal.
Não! Não me revejo eu na citação da primeira estrofe, não sou eu,
Não me reflete, não pode falar de mim, não acredito que seja pessoal.
É como afirmar que os meus amigos são como os meus cigarros e que,
Embora andem sempre comigo, no fundo, só me fazem mal.
Mas fazem mal porquê? Se meus amigos são só fazem bem.
Tudo o resto são premissas falsas, Axiomas sem sentido,
Verdade ou fundamento. Banalidades ditas pelo povo,
Habituado a sacudir a água do capote
Das suas próprias culpas e defeitos.
Eu sou escorpião, afirma comprovadamente
A astrologia. Nascido em novembro, dia seis,
No centro do signo, a meio do dia,
Todavia, não quero a morte a meu favor,
Mas sim a vida, o sorriso, a alegria,
Nem sou sadomasoquista para da dor
Tirar qualquer prazer, que não a tétrica agonia,
Que rejeito como forma do meu ser.
Diz o meu signo que a sensualidade,
O sexo e o amor, são predominantes,
Que gosto de rumar contra a maré,
Que sou solidário, sensível e extrovertido.
Pode ser que sim, mas cada um é o que é
E eu sou somente aquilo que sou
E nada mais do que o que fui e que serei.
Tudo o resto pode vender revistas de cordel,
Mas nada tem a ver com o meu papel
Neste mundo onde vivo e onde existo como ser.
Reconheço que, todavia, não gosto de seguir
A carneirada, talvez por ser escorpião.
Eu sou aquilo que sou (desculpem) e mais nada!
Gil Saraiva
XII
“DUNAS”
Será preciso o toque para se amar alguém?
Não posso responder assim, de ânimo leve,
Por tudo o que sente a humanidade.
Todavia, para mim, que nunca te toquei,
Tu és a minha pérola oriental,
Para mim, que nunca te cheirei ou sequer senti,
Tu és real como o sangue vermelho e fluído
Que me corre de mansinho nas veias.
Como a água que mata a minha sede
Tu és a fonte que sacia o meu desejo.
E a tudo isto eu gostaria de chamar amor,
Porque nada mais há de tão belo,
Tão perfeito, tão divino e tão terreno
Do que o sentir que vem de dentro.
Ao pensar nos teus seios de mulher
A imagem que se forma é de beleza eterna,
De perfeição, de arrepio que ilumina o estro
E que a História soube eternizar.
Embora poucas palavras pareçam existir
Para se descreverem as sensações plenas
Que podem uns seios despertar.
Seios, são como dunas desenhadas pelo vento
Onde dedos suaves nelas deslizam
Ajustando a forma, a consistência ou rigidez.
Esqueçam os exageros absurdos da pornografia
E lembrem os clássicos que, cada um a seu jeito,
Na mestria da sua arte nos apresentam essas dunas,
Sejam eles os escultores, os pintores, os fotógrafos
E os poetas, que as eternizaram num épico
Erotismo pleno de emoção, quase loucura.
Pensem no respirar das dunas à beira-mar,
Húmidas de oceano, com movimentos suaves,
Que em plano horizontal apontam ao infinito.
Será preciso o toque para se amar alguém?
Gil Saraiva