Livro de Poesia - Desassossegos de um Bardo: Quadras Populares - II
II
"QUADRAS POPULARES"
“O MELIDENSE”
(Um Restaurante Típico Alentejano, em Melides. Quadras feitas a pedido do dono: o Senhor Carlos Alberto Pereira que, no final das refeições, oferecia um cartão com uma quadra por cliente.)
I
Se jantar no Melidense,
A comida da Maria
Vai ver como o convence
A voltar no outro dia.
II
Melidense, Melidense,
O que me dás de comer?
- Vê se a lista te convence
É fácil, basta escolher.
III
Melidense, quem diria...
Tem açorda alentejana,
Tem comida da Maria,
Tem comida à fartazana...
IV
Se em Melides passar,
Com a barriga a dar horas,
Há que ir e sem demoras
Ao Melidense manjar.
V
“Melidense me conforte”.
Diz a barriga vazia
Onde a fraca fica forte?
Na cozinha da Maria.
VI
Carlos Alberto Pereira
Te convida p´ra jantar
No Melidense, à maneira
Sem muito teres que gastar.
VII
Toda a semana a servir,
Na quarta é folga certeira,
Melidense, tem sentir
De Carlos Alberto P’reira.
VIII
Quem come no Melidense
De sábado a sexta-feira
Sabe bem quem o convence:
Carlos Alberto Pereira.
IX
Pela boca morre o peixe
Mas aqui vem cozinhado;
Não temos nós quem se queixe,
Ninguém chora bem jantado.
RACISTA
Branco que com branco grita,
Discute pontos de vista,
Porque é que esta mesma fita,
Com negro, já é racista?
RICOS E POBRES
Se um pobre me roubar
Impõe-se pena, com peso,
Se o meu banco me enganar,
Cuidado! Posso ir eu preso...
SANTO ANTÓNIO
I
Beijo, que é Stº. António,
Dia 13, sexta-feira,
Que o santo do matrimónio,
Não vai cair da cadeira.
II
Beijo nesta lua cheia,
Noite de marchas e festa,
Que beijar não dá cadeia,
Se for dado assim na testa.
III
Beijo “prá” doce menina,
Dado com muito carinho,
Que o santo não se amofina,
E nem vai fazer beicinho.
GUERRA DOS SEXOS
Nos sexos há uma luta
Que não tem compreensão:
Porque há de a mulher ser puta
E o homem garanhão?
O AMIGO DA ONÇA
Se queres ser meu amigo,
Mal de mim não digas tu,
Acredita que consigo
Mandar-te levar no cu.
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
Não devia ter casado.
Quem, na mulher, bate, em casa,
Talvez se fosse castrado,
Perdesse força na asa…
O ESPERTINHO
I
Para se pescar, sem rede,
Há que ser especialista,
Quem sem água mata a sede,
É esperto ou oportunista.
II
A mim não me enganas tu…
Tudo sabe o rei do esquema,
Vende frango por peru,
Para ele, truque é poema.
O JUIZ
I
Se fores, em tribunal,
Injustamente acusado,
o juiz que te fez mal
Devia acabar culpado.
II
Condenar, sem ter certeza,
Perdoar, por preconceito,
São critérios de tristeza
De juízes com defeito.
III
Decidir, sem ter razão,
Num juiz é mais que asneira…
Se uma luva é para a mão,
Não se usa na carteira.
A VIDA
Sorria, nunca ande triste,
Pelos caminhos da vida,
Que a vida que em nós existe
Não tem volta, só tem ida…
OS ANIMAIS
Quem maltrata gato e cão
Por apenas malvadez,
Não precisa de prisão,
Mas sim, provar do que fez…
PRESUMÍVEL INOCENTE
Quem diz que sou pecador,
Pobre e mal-agradecido,
Deve ser bom orador,
Acusa, sem ter vivido…
JOGO DE INTERESSES
No calor das madrugadas,
Chamas-me amor, com paixão,
Mas nas montras decoradas
Chamas-me amor, sem razão…
O AMBIENTALISTA
Proteger o ambiente
Está na moda outra vez,
Mas ainda há muita gente
Que diz que faz, mas não fez.
O CORRUPTO
Defender o que é de todos,
Mas não pertence a ninguém,
Pode bem gerar engodos,
Para o proveito de alguém…
VEGAN
Dizes que carne não comes,
Vegan, é que é boa malha,
Ficas magra, quase somes…
Todo o burro come palha…
A TERCEIRA IDADE
Os velhos de antigamente
Eram reserva dos Povos,
Agora, já nem são gente,
Por desrespeito dos novos…
SEGUNDOS SENTIDOS
Mezinha, não é remédio,
Omitir, não é mentir,
Cortejar, não é assédio
Nem ir «prá» cama, é dormir.
MEIO CAMINHO ANDADO
I
Meio caminho é, pela estrada,
Não sofrer, antes sorrir,
É saúde encomendada
Doença levada a rir.
II
Sem saúde, paz, dinheiro,
Não se chega a nenhum lado,
Procura rir tu primeiro:
É meio caminho andado.
III
É meio caminho andado
Pelos azares da vida,
Manter o foco apertado
E rir de cada partida.
PORTA-CHAVES
I
Porta-chaves, chaves porta,
No seu anel prateado,
A chave da minha porta,
Não serve na porta ao lado…
II
Porta chaves quantas são
As chaves desta alma minha?
“- São muitas, mas de latão,
Perdeste a de ouro que eu tinha.”
III
O porta-chaves que tem
As chaves da minha vida
Tem a do mal e do bem,
Da chegada e da partida.
Gil Saraiva