Livro de Poesia - O Donaire do Proterótipo Ordinário: Um Dia Sem Aurora a Despertar - XIV
(A minha homenagem a uma SENHORA deste bairro que adoro, condolências à família, principalmente à D.ª Teresa)
XIV
"UM DIA SEM AURORA A DESPERTAR”
Senti o frio,
Ontem, com a noite a chegar.
O crepúsculo escondia um arrepio,
Que eu não consegui interpretar.
Conjugava-se a trama
Sem que o bairro soubesse,
E algures, numa cama,
A velha senhora, não porque quisesse,
Fechava os olhos para não mais
Os tornar a abrir.
Fechava-se um sorrir
Para voltar jamais…
E em Campo de Ourique,
Se olvidou a ceia,
Esqueceu-se o chique
Esta nova ideia de ser bairro fino,
Porque aqui, na aldeia,
Se cantou o hino
No partir de Aurora.
Na banca da fruta esta lutadora
Não voltará de novo ao mercado
De Campo de Ourique.
Partiu para outro lado,
Pedem-lhe que fique,
Mas esse destino não se vai mudar,
Parte porque parte para não voltar.
Vendia legumes, frutas, vegetais,
Já nem lembra o tempo os anos passados
A atender fregueses ricos ou banais,
A oferecer alegria
Em sacos pesados
Lá na frutaria.
Hoje, o dia chegou sem querer chegar,
Um dia sem Aurora a despertar…
Gil Saraiva