XII
“DUNAS”
Será preciso o toque para se amar alguém?
Não posso responder assim, de ânimo leve,
Por tudo o que sente a humanidade.
Todavia, para mim, que nunca te toquei,
Tu és a minha pérola oriental,
Para mim, que nunca te cheirei ou sequer senti,
Tu és real como o sangue vermelho e fluído
Que me corre de mansinho nas veias.
Como a água que mata a minha sede
Tu és a fonte que sacia o meu desejo.
E a tudo isto eu gostaria de chamar amor,
Porque nada mais há de tão belo,
Tão perfeito, tão divino e tão terreno
Do que o sentir que vem de dentro.
Ao pensar nos teus seios de mulher
A imagem que se forma é de beleza eterna,
De perfeição, de arrepio que ilumina o estro
E que a História soube eternizar.
Embora poucas palavras pareçam existir
Para se descreverem as sensações plenas
Que podem uns seios despertar.
Seios, são como dunas desenhadas pelo vento
Onde dedos suaves nelas deslizam
Ajustando a forma, a consistência ou rigidez.
Esqueçam os exageros absurdos da pornografia
E lembrem os clássicos que, cada um a seu jeito,
Na mestria da sua arte nos apresentam essas dunas,
Sejam eles os escultores, os pintores, os fotógrafos
E os poetas, que as eternizaram num épico
Erotismo pleno de emoção, quase loucura.
Pensem no respirar das dunas à beira-mar,
Húmidas de oceano, com movimentos suaves,
Que em plano horizontal apontam ao infinito.
Será preciso o toque para se amar alguém?
Gil Saraiva
XLIV
“PORQUE EM VEZ DE ÁGUA SE QUER VINHO”
Se perdi a noção de quem eu era
É porque me esqueci dessa alegria,
Que por norma envolvia o que eu fazia,
Como quem vê chegar a primavera.
Tudo por causa dela, essa quimera,
Em quem acreditei, dia após dia.
Sei que não sou quem ela pretendia
E que a gazela, mais do que pantera,
Foi alguém que me usou, como um vizinho,
A quem se pede pão, no meio do monte,
Por não haver ninguém no horizonte
Ou porque, em vez de água, se quer vinho.
Ninguém gosta de ser isco ou engodo,
Resta-me um banho e retirar o lodo…
Gil Saraiva
XXVII
"GOTA DE ÁGUA"
Amor que pela dor é mais amor.
Amor pela distância incendiado.
Amor louco, servil, escravizado!
A dor doce e ardente, qual licor
Me queimando os meus lábios de pudor,
Me dilatando o ventre delicado.
Amor que pela dor é meu reinado
Naquele homem, com garras de condor,
Que Apolo é, para mim, em meu poema!
Um homem sensual, voluptuoso...
Só ele é, a meus olhos, virtuoso,
Por ele nasce, em mim, a dor suprema!
Oh! Mas que importa a minha imensa mágoa,
Se é dor, que por amor, é gota de água.
Ariana Telles
IV
“ORAÇÃO”
(REZAR, AMAR, MATAR...)
OH! Deuses do Mundo Antigo,
Ancestrais Protetores do Homem,
Escutai a Oração do Bom Destino
Fazendo de mim um vosso amigo.
Antes que forças do mal me tomem,
Antes que eu entre em desatino,
Antes que em corpo de homem
Vire menino.
Ó Elementais Deuses do Planeta,
A Vós eu peço proteção e amparo,
À Terra que me dê raízes,
Eu peço a força do Cometa,
A precisão robusta do disparo,
O saber, que vem de Vós, juízes.
Da Água, quero a força do mais forte,
Do Fogo, a ousadia e a coragem.
Ao sopro, ao vento, ao Ar,
Suplico, enfim, por ter um Norte
Nesta vida que vivo de passagem
E onde apenas quero eu rezar.
Pedir, pelo direito de poder amar.
A Vós Elementais Deuses deste mundo,
Eu rezo pelo justo direito que à Paz
Temos todos nós, bem lá no fundo.
Se Vós quiserdes eu serei capaz,
De cumprir sortilégios num segundo,
Protegei-me dos males que vida traz,
HIV, Gripe das Aves ou Antraz…
Não quero eu maus olhados ou inveja,
Que busco por fortuna e bem-estar,
Que a vela vermelha me proteja,
Que depois de rezar eu possa amar.
Ah! Deuses, que meu sangue vire a cera,
Que arde no Vosso Divino Altar,
Sete pedras de sal e me façam forte,
Que roxa vela me ajude a superar
Dores, sofrimentos e má sorte
No meu duro caminho, nesta vida,
Procurando, firme e protegido, de vencida
Poder vencer o mal, vencer a morte!
Pela fragrância do cravo
Venha um futuro
De propriedade, riso, excitação,
Que a citronela acidifique o muro
De qualquer queixa, dor,
Lamentação.
A Vós, Elementais Deus das Verdades,
Eu rogo contra o negativo não,
Que o aroma a ópio traga claridades,
Mantendo feliz e hirto, em qualquer chão,
O meu ser, orando por matar saudades,
Ao implorar, rezar, amar, nesta oração.
Líder de mim, a alma satisfeita,
Se entrega ao mais alto Orixá,
Enquanto meu corpo se deleita,
Com Vossa Divina ajuda de oxalá.
Para que assim seja, porque assim será!
Gil Saraiva
III
“PAISAGEM E PAISAGENS”
Do ocre das fachadas
Das acomodações e dos chalés
Imagens de cor ficam gravadas,
Se destacam os detalhes, lés-a-lés,
Das madeiras, dos alçados,
Das varandas,
Passadeiras, caminhos, cordas bambas,
Delimitando espaços e picados…
São os chalés, por fora, salpicados
De espreguiçadeiras inovando
Ora repouso ameno,
Ora pecados,
Que cabe a cada um ir desvendando…
Tudo se vira ao porto, ao mar
E a Valença,
Ponto continental no horizonte,
Que a noite, ao cair, faz revelar
Do outro lado da água, bem de fronte,
Pelas luzes, as formas e a presença
Que olhando podemos vislumbrar…
É neste contexto que te chamo
De sonho, de alma, de paixão,
É nesta paisagem que te amo,
Na relva, na varanda, no colchão…
Perco-me em teu olhar
E sou feliz,
Feliz por te sentir,
Por te tocar,
Por saber que amanhã
Vou acordar
Com tua fragrância em meu nariz…
Mas mais do que esta ilha
Deslumbrante,
Inventada para amores intensos,
Vivos,
Tu és, amor, hoje e doravante
A paisagem de meus passos
Ainda conjuntivos…
Mas em montes e vales me quero perder,
Nas tuas paisagens vou viver,
Sem precisar de outros atrativos…
São paisagens reais que amo e friso
Só porque adoro estar no paraíso…
Gil Saraiva
* Parte I I - Portaló ou o Sortilégio do Paraíso