XIV
“O AFINISMO HUMANO”
Não existe no dicionário a palavra “afinismo”,
É uma palavra só minha, pessoal, por mim criada, um neologismo,
Talvez, de vão de escada, contudo, cheio de significado e de lirismo.
Afinismo vem de afim, ou seja, semelhante, análogo, idêntico, igual
Ou parecido, ou seja, similar e consonante com um pensamento
Envolvido numa mesma forma de estar, de agir ou de gostar,
De seres diferentes, que por concordarem nisso se pensam unir,
Criando clubes, partidos, gerando umas correntes, onde se trocam ideias,
Onde a permuta é algo coerente e onde o objetivo é semelhante,
Próximo, comum, onde se luta pela mesma causa aliciante.
Pondo as rimas de parte, o afinismo é aplicação biunívoca entre duas
Ou mais coisas, sejam estas, atos, pensamentos, objetos ou ideias,
Tendo entre elas um denominador comum que une duas ou mais pessoas
Em seu torno e em sua defesa. Quando levado ao extremo, a sério
Ou à legalidade, ajuda a formar casais, partidários, adeptos, próximos,
Amigos, vizinhos, famílias e confrades. Porquê? Porque cada grupo
Se sente unido por perspetivas e projectividades de origem única,
Ou de princípios idênticos, quase iguais, diria… gémeos.
Cada movimento se agrega então, seguindo uma mesma linha reta
Ou uma outra que lhe seja colateral, de preferência paralela
Ou espelhada nos mesmos conceitos primários.
O afinismo defende que a sociedade se organiza em volta
Das mesmas analogias, conexões ou tendências,
Sendo que todas elas buscam a combinação associativa,
Ou legal se o direito dos Estados o exigir.
A História faz prova disso mesmo, nos milénios até
Hoje conhecidos, pois que sempre nos organizámos assim:
Entorno de uma terra, de um país, de uma língua,
De um líder ou de uma bandeira.
O afinismo promove as empatias, gera classes sociais
E sindicatos, ordens, movimentos, princípios,
Direitos e por fim as leis da sociedade.
Mesmo do campo emocional e do sentir
O afinismo cria os laços certos,
Seja entre casais ou entre amantes,
Seja no ódio, na dor, ou no amor.
Gil Saraiva
XXIV
"O SER HUMANO”
Bem devagar devasta o ser humano
A natureza, sem qualquer pudor.
O rio, ao vê-lo, foge incolor,
Duvidoso, o luar, se afasta insano,
Tão cansado de o ver, ano após ano.
Pelas veredas só se gasta a cor
E nas nascentes vida, sem sabor,
Contamina quem bebe, causa dano,
Por vírus e bactérias faz doentes.
Esse pálido ser quase se arrasta:
Boca, nariz, olhar murcho, uma pasta,
Flácido, cavernoso, ombros pendentes.
Se o ser humano der o salto agora
Talvez se salve a Terra que ele ignora…
Gil Saraiva
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"TOCA-ME"
Quando aquela mão
Se estende decidida e sensual,
Num caminho seguro,
Até tocar suave
Um membro adormecido,
Despertamos nós...
Desperta o príncipe
Com coaxares de sapo,
Porque a magia
Se fez vida
E gozo último...
Quantos de nós, homens,
Antropófagos do sentir,
Não atingimos o céu
Antes do tempo
E tudo por um toque apenas?
Ahhhhhh...
Isto é vida!
Nada se compara
Ao arrepio da derme
Perante um deslizar
De dedos ao acaso.
Nada é mais intenso
Do que sentirmos a mão,
A nossa mão,
Navegar serena,
Pela derme de outro alguém,
Procurando o calor ameno
De um Trópico de Câncer
Ou Capricórnio...
Pra mergulhar ardente
Num vulcão de amor
E nos fazer arder
Sem febre alguma
Que não aquela
A que chamamos de paixão...
Partir do que é geral
Para o mais específico,
Íntimo, privado e particular...
Sentir a preocupação das formas,
Das cores, do brilho,
Do estado hipnótico de um toque,
Em impressões táteis
De impensáveis sensações
De loucura frenética e absoluta...
Depois...
Procurar uma ordenação tátil
Dos elementos do percurso
E projetá-los em cenas
De luxúria conseguida e integral...
Por fim...
Gritar em êxtase:
Toca-me, de novo, meu amor!!!
A Mulher,
Mais do que ser humano,
É arte viva,
Sente
Como nenhum outro espécime
À face do planeta...
E faz sentir...
Chegamos ao infinito
Num só toque...
E de lá voltamos para podermos,
Também nós,
Tocar e atingir assim
O despertar de uma aurora
Que nasce pura de êxtase
E plena de prazer!...
A Mulher
Faz uivar bem lá no fundo
Aquele ser esquecido,
De ser gente,
De ter vida,
De ter voz...
E provoca do íntimo
A alma ansiosa de sentir,
Perdida de sentido,
De momento,
Já faz muito e muito tempo,
Para gritar, por fim,
Em pleno êxtase:
Toca-me, de novo, meu amor!!!
Gil Saraiva
![Gil 11 04 2019 c.JPG Gil 11 04 2019 c.JPG]()
“SOU”
Eu sou uma parte do que escrevo,
E escrevo para saber aquilo que sou,
Sou ego, animal, humano, trevo,
Sou tudo o que fui, o que amou,
Riu, sentiu, viveu e teve medo,
Esperança, fé; eu sou quem já chorou;
E continuo a achar que ainda é cedo,
Para ser muito mais daquilo que sou!
Gil Saraiva