VII
"EMBRIÃO"
"- Já sinto o nosso menino..."
Diz a mãe,
Com lágrimas nos olhos
E flores no coração...
"- Vem, põe aqui a mão,
Também o sentes?"
E o pai envergonhado
Diz que não...
O embrião corre pró milagre,
Mais alguns meses
E irá nascer...
E os pais perguntam:
"- Quem será ele um dia?"
"- Que missão terá ele
Neste mundo?"
"- O que fará
O nosso querido filho...?"
"- Que nome lhe daremos?"
"- Adolfo...?"
"- Lindo..."
Diz o pai...
"- Adolfo... Adolfo Hitler!"
Até o mal,
Um dia, teve
De nascer...
E quantas vezes
Ele nasce
Por amor?
O que faríamos nós
Se, previamente,
Conseguíssemos saber?...
Gil Saraiva
"VEM"
Vem...
Extraterrestre que o céu
Ao Homem te entregou
Porque as fábulas não servem pra sonhar!
Vem...
Fantasma que a casa
Ao anoitecer expulsou
Porque as fábulas não são para assustar!
Vem...
Sereia que o mar
Um dia rejeitou
Porque as fábulas não sabem nadar!
Vem...
Lobisomem que a Lua
Uma noite abandonou
Porque as fábulas não vivem ao luar!
Vem...
Abominável Homem que a neve
Uma manhã desmascarou
Porque as fábulas não sabem hibernar!
Vem...
Vampiro que a noite
Ao nascer da aurora atraiçoou
Porque as fábulas não vivem a sangrar!
Vem...
Loch Ness que o lago
Da eterna neblina se acabou
Porque as fábulas também têm de acabar!
Vem...
Conto de fadas, mito, animação,
Mistério oculto no fundo mais profundo,
Bruxedo, animal, pré-histórico, ladrão,
Mágico, mago, astronauta em novo mundo...
Vem...
Venham... bruxa, fada, feiticeira, anjo,
E porque não um pouco de diabo,
Adamastor nas dobras de outro cabo!
Vem...
E sejas conto, fábula, ou página de história,
Ou auto da derrota ou da vitória,
Mito, religião, Bíblia, mentira,
Credo, cruzes e um pouco mais de fé...
Vem...
Venham encher com tudo isto esta minha alma
Que ficou cega, vazia, nua,
Abandonada...
E quer poder sonhar
E ser amada
Mesmo que o preço seja não ser nada!
Vem...
Porque as fábulas não servem pra sonhar!
Porque as fábulas também têm de acabar!
Gil Saraiva
"DOR SUPREMA"
Tu, que dentro de ti alimentaste:
A única, no mundo, maravilha;
A única, no mar, sagrada ilha...
Singela, linda e pura, em contraste
Com as restantes ilhas pra que olhaste...
Só tu sabes, como eu, que já não brilha
Dentro desse teu ventre a nossa filha,
Que tanto, tempos antes, desejaste.
Só tu provas, como eu, o amargo gosto...
Só tu, pra além de mim, tens dor suprema,
De não ter visto esse choroso rosto
Da criança nascendo sem problema...
Só tu vives, como eu, o aqui exposto...
Só tu e eu sentimos o poema!
Gil Saraiva