XIX
“OÁSIS II”
Oásis no deserto escondido,
Fonte onde, apenas eu, a sede, seco
E pela qual meu ser eu hipoteco,
Por me encontrar a ela resumido.
Um rio, até aqui desconhecido,
A única saída do meu beco,
No qual a minha voz não tem mais eco
Que a de um vagabundo, ali, perdido.
Oásis, tu que escondes a nascente,
Da vida e do Amor, em teus recantos,
Diz-me como te encontro, entre meus prantos,
Mostra-me esse caminho transparente.
Pois em ti minha sede saciada
Pode levar-me já, de volta à estrada!
Gil Saraiva
II
"ELA..."
Ela
Não podia estar ali...
Talvez...
Nos confins do pensamento,
Longe de tudo...
Não de todos!...
Um rosto jovem no sorrir...
Um rosto,
Com raios de Sol
Caindo nos ombros,
Em cabelos de um ouro
Que brilha no escuro...
O azul do mar
Repousando nas pálpebras,
De uns olhos castanhos
Que brilham também...
Um doce poente
Poisado nos lábios,
De uma boca que arde
E cheira a pecado...
Um luar de prata
Em seu meigo rosto,
De uma Lua Cheia
Que ilumina a serra...
Os traços de Vénus
Moldados num corpo,
Que Gaia quis tão fértil
Como sensual...
O entardecer
Descendo no ventre,
Qual crepúsculo
Anunciando a plenitude...
O sabor a sal
Colando-lhe as coxas,
Húmidas de ansiedade,
De ante prazer...
O toque da seda
Envolvendo os seios,
Tentando esconder
A derme perfeita...
O amor perdido
Em seu terno olhar,
Que busca, sedento,
Outro olhar igual...
E um ar de oásis
Cobrindo-lhe a pele,
Qual neblina ténue
Desejando Sol...
Ela...
Não podia estar ali...
Talvez...
Perto de alguém,
Imaginário ninguém,
A quem espera,
Um dia,
Vir a encontrar!...
Ela
Não podia estar ali...!
Não!...
Não existe tal paisagem,
Pois as quimeras
Nunca são reais!
Mas...
Se por força
De acasos impensáveis,
A paisagem
Não for mera miragem...
Se o ocaso
Realmente for poente
Que chega ante meus olhos
Suspensos na exceção,
Então... então...
Então tudo eu dou
Pela paisagem!...
O que sou,
O que fui
E o que serei,
O que tenho
E o que possa vir a ter...
Tudo!...
Porque tudo é pouco
Se puder na paisagem
Meu ser eu colocar...
Num canto,
Ali...
Mas enquadrado...
Ela
Não podia estar ali...
Gil Saraiva
"OÁSIS"
Oásis no deserto escondido,
Fonte onde, apenas eu, a sede, seco
E pela qual meu ser eu hipoteco,
Por me encontrar a ela resumido...
Um rio, até aqui desconhecido;
A única saída daquele beco,
No qual a minha voz não tinha eco
E no qual eu teria apodrecido,
Se a tempo não desse eu com a nascente,
Fugindo, logo então, de imediato,
Daquel’ recanto podre, delinquente,
Sinónimo de mundo e aparato,
Para esse meu oásis transparente,
Que da tua figura é o retrato...
Gil Saraiva