XXX
"PAI E AS ORIGENS DO MEU EU"
Esse homem viveu sempre a trabalhar,
Dia após dia, todos os dias,
Ano após ano, mil anomalias,
Todas elas urgentes em tratar.
Médico, antes de a pai poder chegar,
Amigo dos doentes, das azias
E dores um combatente, em mil vigias,
Sem hora de dormir ou de acordar.
Na medicina o médico e o amante,
Da arte para a qual ele foi criado,
Repartiu minha mãe, quase em pecado,
Com a cura, o tratar de um semelhante.
Já faleceu, cansou-se o coração,
E eu, da sua vida, herdei paixão!
Gil Saraiva
XXVII
"FALAR DE DEUS SEM GARANTIAS"
Dizer, que nunca mata a alma a morte
E que sem corpo temos outra vida,
A qual é a esperança, aqui, vivida
Por esse em quem a fé tem o suporte;
Dizer, que o universo é passaporte
Para mundos da carne já esquecida,
Lá onde a injustiça é bem punida;
Dizer, gritar, que Deus é o mais forte,
Pois Ele é Deus, esse Omnipotente,
E Ele é Pai, Filho e ‘spiríto Santo,
Ele é Verdade, Luz, Palavra, Encanto,
Pois Ele é Deus, esse Omnisciente,
É coisa de profetas e messias;
Porquê falar de Deus sem garantias?
Gil Saraiva
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V
“CHAMAR PAI”
Na vida,
Em toda a vida existe apenas
Um ser a quem podemos chamar Pai.
Sobre o meu…
Eu lembro o Homem,
O ser maravilhoso,
O altruísta,
Carinhoso,
Atento, forte,
O tal pilar,
Que me fez gente,
Que me deu a pista
Da luta que é a vida,
Da conquista
Da honra, do saber,
Do caminhar…
Na vida,
Em toda a vida existe apenas
Um ser a quem podemos chamar Pai.
De grandes mãos,
Nem sempre carinhosas,
De voz grossa,
Nem sempre satisfeita,
De suor e trabalho,
De raça e proteção,
De luta em épocas nervosas,
De quem vigilante se não deita
Se dai depender no amanhã meu pão…
Na vida,
Em toda a vida existe apenas
Um ser a quem podemos chamar Pai.
Ele foi meu médico,
Enfermeiro, socorrista,
Meu mestre,
Meu modelo, meu herói,
O professor mais dedicado,
Mais atento,
O génio, o mago,
O alquimista,
Onde a minha vida se criou
E se constrói
Nas bases que não leva o vento
Porque são sólidas,
Quais colunas de aço,
Que me fizeram firme cada passo.
Na vida,
Em toda a vida existe apenas
Um ser a quem podemos chamar Pai.
Nem sempre o entendi,
Pensei, por vezes,
Que nem sequer me ouvia,
Que me ignorava o existir…
Mas, afinal, ele estava ali
Vigiando não só como eu crescia
Como se estava bem no progredir,
Nervoso por
Qual Anjo da Guarda
Me vigiar atento a retaguarda…
Na vida,
Em toda a vida existe apenas
Um ser a quem podemos chamar Pai.
Do amor que me ofereceu nada,
Em troca, pediu,
Nas asneiras que fiz
Me deu conselhos,
Dele tive suporte,
Parabéns e alegrias,
Felicidade sempre que sorriu,
Lágrimas nos difíceis dias,
Mas nunca desistiu,
Nunca partiu…
Meu Pai,
Meu amigo,
Companheiro,
Um exemplo para mim,
Para o mundo inteiro,
É alma pura
Em trono de marfim.
Ele é o meu exemplo
Mais perfeito,
Ele que vive para sempre
No meu peito…
Hoje
Podia ser Dia do Pai,
Bem que podia,
Mas Dia do meu Pai
É qualquer dia!
Se algo houvesse a fazer,
Por mim,
Ele o faria,
Mas nem por isso,
Muitas das vezes,
Me o diria…
Assim, era o meu Pai,
Severo, austero,
Sempre com uma piada
Atrás das costas,
Um amigo,
Mesmo um camarada,
Sempre pronto para tudo,
Do amor… à espada.
Na vida,
Em toda a vida existe apenas
Um ser a quem podemos chamar Pai.
Gil Saraiva
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"CHORAI"
Chorai...
Chorai comigo os filhos das Trevas...
Aqueles que chutam a bola
Apocalíptica dos sonhos sem prazer...
Aqueles a quem a vida disse, um dia,
Pra sofrerem as torturas da agulha;
A doce sensação do não sentir;
E o ventre seco e frio da própria
Morte...
Chorai...
Chorai comigo os filhos das Trevas...
Aqueles que veneram a miragem negra,
Heroína suprema dos homens
Sem rosto, sem nome
E sem força de vontade
Ou sem amor...
Chorai...
Chorai comigo os filhos das Trevas...
Porque deles é o reino da vida
Sem Futuro,
Porque neles tudo é estéril,
Seco e sem sentido;
Porque eles são o espelho mais triste
Do Inferno.
Chorai...
Chorai comigo os filhos das Trevas...
Porque entre eles passeia a Negra Dama,
Plena de clientes, satisfeita...
Porque de Tchernobil já estão vacinados...
Porque oxigénio, Amazonas e ozono,
São coisas supérfluas, palavras soltas,
Num mundo que deixaram já faz tempo...
Porque a SIDA é apenas um atalho,
Não um mal, apenas e somente
O caminho mais curto para quem
Já não tem tempo...
Chorai...
Chorai comigo os filhos das Trevas...
Lagartas fechadas num casulo
Selado nas veias, ocas de sangue,
Plenas de vício e de tristeza...
Crisálidas, uns insetos humanos
Que nunca serão gente;
Vazios de esperança, carentes de voz...
Seres de asas queimadas
Que jamais voarão rumo à liberdade;
Que jamais sentirão o cheiro das flores,
O gosto, o gozo de voar, ser borboleta...
Chorai...
Chorai comigo os filhos das Trevas...
Chorai lágrimas de amigo, irmão, de primo
Ou filho até...
Chorai os que odeiam, agora, a luz
do Astro Rei...
Chorai os corpos vivos
A quem a mente abandonou...
Chorai aqueles que andam à procura
Da alma que não sabem encontrar...
Chorai...
Chorai comigo os filhos das Trevas...
Chorai também aqueles olhos parados...
Deus…!!!
Aqueles olhos parados de quem já foi criança,
De quem era tão engraçadinho
Nos primeiros sorrisos... lembram...?
E quando, um dia, ele te chamou "- Mamã..."
Ainda te recordas…?
E quando, a dado momento,
Deu os primeiros passos,
E tu, pai orgulhoso,
O abraçaste entre as essas mãos,
Amostras firmes de vigor,
Então tão carinhosas...
Não é fácil esquecer…!!!
Chorai...
Chorai comigo os filhos das Trevas...
Que já tiveram mãe, avós, amigos,
A quem demos a mão,
Com quem brincamos à apanhada,
Escondidas, cabra-cega, monopólio,
Damas, xadrez, gamão, jogos de cartas,
De amor, carinho, afeto ou de amizade...
Chorai... Aqueles que sabiam quem tu eras,
A quem contavas, baixinho... a rir, talvez...
Segredos que o mundo inteiro ignorava.
Chorai...
Chorai comigo os filhos das Trevas...
E sejam brancos, negros, vermelhos,
Arraçados; chineses, esquimós, gregos,
Franceses, angolanos, alemães
Ou portugueses, não nos importa a nós...
Chorai...
Chorai comigo budistas,
Católicos, ateus ou protestantes;
Velhos, crianças, meninos e meninas,
Jovens na flor da idade, homens, mulheres,
E toda a gente que neste mundo exista...
Chorai...
Chorai comigo...
Uni hoje vossa dor à minha mágoa.
Chorai, chorai comigo, ó, por favor...
Que a culpa não é só de quem cultiva,
Trafica ou se vicia... Mas sim de todos nós
Que não fazemos nada para ceifar da Terra
A triste chaga... Ao menos... chorai...
Chorai...
Chorai comigo os filhos das Trevas...
Condenados por nós à Morte lenta...
Chorai...
Chorai comigo...
Chorai, chorai comigo...
Chorai...
Chorai comigo os filhos das Trevas...
Gil Saraiva