Livro de Poesia: Serra da Lua: Palácio da Pena - VII
VIII
"PALÁCIO DA PENA"
A tarde de Domingo
Respirava a bruma,
O capacete húmido da Serra da Lua,
Cujo verde tem,
Na multiplicidade das espécies,
A singularidade exótica de toda a região...
De botas de montanha,
Tu e eu, mão na mão,
Tomámos as estradas e os caminhos
Da Serra da Lua,
Rumando à natura e ao romance...
Podíamos ter partido de Sintra,
Quais exploradores aventureiros,
Até às proximidades do cabo da Roca,
Explorando o verde, por entre
Os beijos trocados, sem medo,
Ao som de rouxinóis...
Poderíamos ter seguindo
Depois pela via
Que liga Colares a Cascais,
Pela praia do Guincho,
Sentindo os salpicos da maré
Nos despertando
A alma e os sentidos...
Mas... seguimos rumo à Lua,
Senhora suprema dos amantes,
Pela estrada da Pena,
Montanha a cima,
Em torcicolos apertados,
Curvas e contracurvas,
Que se sucedem e quase sobrepõem,
Me fazendo sonhar, com as margens
Do teu corpo feito mulher...
Subimos na sombra serena e húmida
De velhas árvores, Pena a dentro,
E onde, por vezes, muitas,
Não entra a luz da Lua
Ou mesmo um raio de sol,
Mas... onde a tua áurea se funde
Com a minha... num facho de amor...
Caminhámos ladeados de muros,
Repletos de hera e musgos,
Cobertos de verdes matizes e,
Aqui e ali, molhámos os lábios,
Nas fontes frescas e cristalinas,
Nos fios de água que apuram
A sensação de humidade que,
Por todo o lado, se respira
E nos invade os corpos,
Sedentos de paixão,
E nos faz transudar
No tapete de folhagem seca...
Ao subir...
Vão rareando as quintas.
As casas...
E a Serra ganha novo verde...
A cada passo,
De um e de outro lado,
A floresta é rainha,
Por entre ciclópicos
Amontoados de rochedos
Cinza e verde,
Alguns quase que suspensos,
Parecendo prontos a desabar,
Como as nossas almas,
Arfando bruma
E amor na escalada verde...
Quase no cimo o parque espera-nos...
Passamos a Porta dos Lagos,
Monte a dentro,
Ainda de mãos dadas,
Depois outra porta mais...
Para o Castelo dos Mouros,
Que não seguimos,
E entramos no Parque,
Pela Porta Principal,
Quais conquistadores de vida,
Rumo ao triunfo de um amor...
A estrada dá-nos a volta à mente
E numa espiral, quase completa,
Atinge a mole granítica acinzentada,
Onde assenta, único e esplendoroso,
O Palácio da Pena,
Destino da rota
Que traçámos antes do entardecer...
Com um sorriso nos lábios,
De narinas invadidas pelo cheiro
Da terra molhada,
Eu recebo triunfante
O beijo
Que provém da tua boca...
É noite...
O Palácio iluminado
Está aberto ao público nesta hora...
São os quinhentos anos
Agora celebrados...
A Lua Cheia brilha de fulgor,
Ao lado do mítico edifício,
Por entre as sombras negras do arvoredo...
Tudo se queda no silêncio
Mais que profundo...
O belo torna-se real...
E, de mãos dadas,
A teu lado,
Eu descubro,
Por fim, a poesia...
Gil Saraiva