XIII
"DORME EM PAZ"
Lembro...
Lembro como se fosse ontem...
Lembras-te?
Ainda te recordas?
Foi uma reunião vivida.
Uma união louca...
O focinho do teu cão ficou vermelho de pudor
E ao canário demorou a voltar-lhe o pio.
Só os lençóis do nosso leito
Acharam natural o que foi feito.
E tu rias,
Ó como tu rias.
Pela janela escutávamos o riacho
E as mariposas batiam as asas
Para lá do varandim
Acenando-nos, ao vento, as boas vindas.
O meu pai era contra...
Embora, bem no fim,
Se tenha rendido ao nosso amor
E concordado com a nossa felicidade
Sem mais entraves,
Sem mais problemas.
Nunca deixei que tivesses remorsos.
Nunca permiti sequer um arrependimento.
Nunca te neguei tudo o que sou.
Nunca te tirei o que tu eras.
Nunca te enganei num pensamento.
Nunca o teu olhar me perturbou.
Amei-te sempre,
Dia-a-dia, hora e momento!
Dorme em paz, agora, ó meu amor...
Gil Saraiva
II
“BAHIA”
Há quem diga que o céu
Pode esperar…
Neste momento meu,
Basta ficar
Mais perto,
Mais certo
Desse paraíso, por fim,
Localizar…
Terra sagrada onde Eva
Viu Adão,
Sonhos que a vida leva
Num rio de paixão…
Vamos
Para o sonhado mundo
Da nossa imaginação.
Iniciamos, lá do fundo,
A viagem final com um sorriso,
Por que é bom
Viajar para o paraíso…
Primeiro a Via Láctea,
Galáxia nossa
no Universo imenso…
Uma vez localizada
Procurar a agulha no intenso
Palheiro celestial
E, quando encontrada,
Desvendar por fim o Sistema Solar,
Berço do nosso bem,
Do nosso mal,
Coisa nossa,
Casa, terra, lar…
Depois…
Depois o Sol, os Planetas…
Olha a Terra… oceanos, continentes…
Paz e guerra…
E finalmente,
Já focando os trópicos,
Bem na nossa frente,
Mais perto,
Mais à vista, mais concreto,
Avistar o triângulo sul-americano,
Ouvir o leopardo, a harpia
E o tucano…
Solos de Vera Cruz,
Solo brasileiro,
Que Portugal, há tempos,
Viu primeiro…
Avistar, agora, bem mais perto
O azul e verde da Bahia,
Imagem inversa do deserto,
De mata atlântica,
Que vibra de harmonia…
Terra brilhando plena
À luz do Astro Rei,
Joia maior que descrever nem sei…
Eis, ali, na nossa frente,
A sagrada Bahia,
Finalmente…
Imagem venerada
Que se guarda, qual tesouro,
Que brilha mais que o ouro,
Num verde e azul por si só tão reluzente…
E quase gemo de prazer e depois grito:
“- Amor, caramba! Isto é Bahia
E é tão bonito!”
Gil Saraiva
* Parte I - Paisagens ou o Sortilégio da Paixão
"SAUDADES"
Saudades
Choro de um riso antigo
Hoje recordado...
Saudades
Vou deixando
Aqui, além...
Recordações
Eu guardo dos meus passos:
Daquele alguém que um dia olhou pra mim
E me chamou de amigo...
E num olhar
Disse poder guardar de mim memória
E registar bem fundo o meu sorriso...
Saudades
Vou guardando, conformado,
Daqui, de além e de todo o lado
Onde há um abraço de amizade;
Onde a Humanidade for humana;
Onde a Paz existir na Natureza
E onde a Liberdade for amada...
Saudades,
Nostalgias, lembranças, emoções
E outros sentimentos pouco claros
Que vão ficando em nós
E que nos tornam
Produtos inventados pela mente
De quem a nosso lado já viveu
E guardou para si a nossa imagem...
Saudades
De outrora... de uma hora,
Daquele momento exato,
Inesquecível,
Daquele instante louco, fugidio,
Em que a flor abriu, desabrochou...
Ou de outro que não conto por pudor,
Mas que por certo falava de Amor...
Saudades,
Momentos presentes do Passado
Que o Futuro não pode apagar;
Vivências de uma vida,
Lágrimas de dor, felicidade,
Desejos e gritos já vividos;
Anos de sonho e de saudades
E dias que são claras ilusões...
Saudades
Vou guardando, vou deixando
Aqui, ali, além, por todo o lado
Onde a lágrima seja borboleta
Ou onde a eternidade iluminada
Se reduza breve, num segundo,
A gotas de orvalho e de saudade...
Saudades
Choro de um riso antigo
Hoje, uma vez mais,
Já recordado
Ou novamente,
Até que enfim, reencontrado!...
Saudades
Choro de um riso antigo...
Gil Saraiva